Jorge Casimiro Congo, que foi (será que poderá voltar a ser?) um emblemático e não menos polémico padre da diocese de Cabinda, foi nomeado e empossado em 8 de Fevereiro de 2018 como Secretário da Educação pelo então Governador de Cabinda (hoje ministro), General Eugénio César Laborinho. Ontem foi exonerado pelo actual Governador e ex-ministro, Marcos Alexandre Nhunga.
Por Orlando Castro (*)
Os Secretários provinciais são os responsáveis locais dos ministérios (designados nas demais províncias como directores provinciais), e esta especificidade constitui a essência do famigerado estatuto especial de Cabinda, cujo hábil arquitecto foi Eduardo dos Santos, coadjuvado pelo seu fiel, obsequioso e voluntarioso pedreiro António Bento Bembe.
Recorda-se que Jorge Casimiro Congo foi ordenado sacerdote (ainda antes da criação da diocese de Cabinda), e posteriormente encardinado nessa diocese, após a sua erecção. Na nova diocese, foi sucessivamente padre, vigário-geral e pároco da Igreja da Imaculada Conceição, da antiga Missão Católica de Cabinda.
Reduzido compulsivamente ao estado laico, em 2011, no contexto da crise da Igreja Católica Romana, nascida na referida diocese, na sequência da aliança (ou pecaminosa conspiração) daquela Igreja com o MPLA e a República de Angola contra Cabinda e os cabindas, aliança inspirada, negociada e animada pelo sinistro núncio apostólico Ângelo Becciu, tornou-se, nos últimos anos, responsável e animador principal da Igreja Católica das Américas, uma das denominações da não menos polémica (e estranhamente) confederada ICCA (Igreja da Conciliação Cristã de Angola), do Reverendo Pastor Antunes Huambo.
Jorge Congo foi um dos inspiradores do CNC (Comité dos Nacionais de Cabinda), com o Reverendo Pastor Afonso Justino Waco (1994) e co-fundador da Mpalabanda – Associação Cívica de Cabinda (2003), de que foi também Presidente da Mesa da Assembleia Geral. Entre 2004 e 2007, foi Director do Pólo de Cabinda da Universidade Lusíada de Angola (depois Instituto Superior Politécnico Lusíada de Cabinda), onde foi um dos principais e mais antigos docentes.
A nomeação de 2018 consumou uma rápida e (para muitos, surpreendente) reviravolta de Jorge Congo, que sempre se considerou incapaz de suportar e tolerar o MPLA, mostrando-se, em todas as circunstâncias, por palavras, actos e gestos, totalmente oposto ao MPLA, ao seu programa e às suas iniciativas, sobretudo em Cabinda («não os posso sentir»!).
Tentou várias e sucessivas aproximações e/ou alianças com alguns partidos da oposição angolana, nomeadamente: a FpD (Frente para a Democracia, a UNITA, o Partido Popular (de David Mendes), o Bloco Democrático e a CASA-CE. Depressa se afastava, desiludido e desanimado, dizendo-se sempre traído e incompreendido, e os seus ideais e aspirações rejeitadas ou não suficientemente apoiadas e aprovadas!
Mas o ano 2017 começou a soprar uma (quase) imperceptível brisa de mudança, que cedo o embalaram, talvez como expressão dum antagonismo imaginado ou criado para justificar compromissos anteriores não assumidos publicamente.
Alguns, erradamente, atribuíram esta conversão ao então novo governador, Eugénio Laborinho, apontado como negociador do contrato matrimonial. Não foi, porém, o facto.
Na verdade tudo começou com um antigo e clandestino namoro entre Jorge Congo e o MPLA. A coberto desse namoro, Jorge Congo seria um dos apoiantes (secretos) do Memorando de Entendimento (dito de Bento Bembe) e, por via dessa cumplicidade, ambos partilhariam alguns interesses económicos e uma colaboração e amizade antigas.
O namoro oficial remonta a 2017. Iiniciou-se no consulado de Aldina Matilde Barros da Lomba (Catembo), na sequência do anúncio da parceria eleitoral entre a UNITA e a sociedade civil de Cabinda (através do GR – Grupo de Reflexão, de que também era membro, mas do qual se afastou posteriormente, sem dar qualquer explicação ou justificação aos seus correligionários). Limitou-se a referir-lhes o diálogo que teve, nessa altura, com a (então) governadora, que na ocasião estava acompanhada do seu irmão Euclides da Lomba, Secretário da Cultura, de quem no passado foi grande amigo e próximo, nomeadamente no âmbito do CNC.
Posteriormente, celebrou-se o noivado, que foi apadrinhado conjuntamente por Julião Mateus Paulo (Dino Matross) e António Paulo Cassoma. E, à boa maneira africana, o noivado foi acompanhado do respectivo alambamento.
Com a sua nomeação como governador de Cabinda, Eugénio Laborinho herdou o referido noivado e, desde então, mostrou-se sempre (como representante ou chefe da família do noivo, não se sabe muito bem) muito interessado, escrupuloso e solícito, com expressões e manifestações mútuas de amizade, estima e apreço.
O casamento consumou-se de imediato. Sem coragem para louvar, limitamo-nos a assinalar a coragem e determinação que o gesto de Jorge Congo representa, tendo em conta, por um lado, o contexto em que se enquadrou e, por outro lado, os numerosos, delicados e (praticamente) irrealizáveis desafios que a educação representa e a quase impossibilidade de melhorar o processo de ensino e aprendizagem ou implementar um programa alternativo, dada a absoluta falta de meios, a incompatibilidade de humores e de visões (em relação às tutelas – governador e ministro-, a montante; e à massa subordinada, – professores, colaboradores, e… SINPROF, a jusante), as diferenças de carácter, de prioridades e de objectivos.
Foi, de facto, grande a coragem, a ousadia. No dia 8 de Fevereiro de 2018, o Folha 8 perguntava: Mas será verdadeira coragem aquela que leva alguém ao suicídio? Será mesmo uma virtude, um valor? Não será antes um vício, um defeito?
Em África, diz-se amiúde, os casamentos realizam-se entre famílias. No caso vertente, temos uma família, o MPLA, dum lado; mas do outro, temos apenas uma pessoa (aparentemente, só e isolada), Jorge Congo. Ademais, a própria família (que assume este inesperado casamento) não é casamenteira, no nosso meio (isto é, entre os cabindas). Tem sido sempre intolerante e visceralmente oposta à sociedade civil (de que tem sido sempre opressora e inimiga): Apenas domina, oprime, explora, mostrando-se muitas vezes cruel e sanguinária.
Foram precisamente essa atitude, esse posicionamento e essa actuação (de oposição e intolerância para com a sociedade civil) que a levaram a extinguir a Mpalabanda e a levam até hoje a impedir o Tribunal Supremo de julgar o recurso daquela associação (pasme-se, desde… 2006!!!), a despeito de se considerar como patrona ou dona dum Estado democrático e de direito!
Até agora, os membros da sociedade civil (de Cabinda), que integraram alguma instituição angolana, fizeram-no em parceria e solidariedade com a oposição, maxime a UNITA!
O gesto do MPLA foi novo, se não mesmo, insólito. Não foi um abraço à sociedade civil: foi apenas uma manobra de diversão e divisão, e mesmo um pressuposto para o propalado melhora(u)mento do Memorando de (des)Entendimento que passou a ter um novo interlocutor válido (ou antes, validado), a FCC (Frente Consensual Cabindesa), de Belchior Lanso Tati, que aparece então como principal aliado de Jorge Congo.
Meses depois começaram a aparecer os questionamentos, as insubordinações, as queixas e as renegações… Não foram criadas as condições para corrigir o que estava e está (realmente) mal e melhorar o que estava (eventualmente) bem (se há algo que esteja bem), converter, disciplinar e motivar as pessoas. No dia da posse o Folha 8 escreveu: “Teme-se que, nos próximos tempos, se assista a um rocambolesco e escandaloso divórcio! Mas não o desejamos: Preferiríamos que fossem criadas as condições e reunidos os pressupostos para salvar o (nosso) ensino. Mas esse voto, ardentemente desejado, não nos deve impedir de sermos lúcidos e realistas”.
(*) Com Franckie Raskal